Editorial: Quando o subliminar é para confundir em benefício dos oportunistas
(Ou: o trem da história não pode descarrilar)
Não vamos bater em ferro frio, mas é preciso esfriar o calor de todas as falas.
Para os menos informados, apaixonados “brigadores” de última hora, desde o primeiro anúncio sobre as possibilidades de revitalização da Estrada de Ferro Campos do Jordão, o trecho maior do percurso, 28 km até Santo Antônio do Pinhal, esteve contemplado nos estudos e nos projetos.
NUNCA houve desprezo ou pouco caso no tocante a isso.
Mas, em sentido figurativo, já passou aquele tempo em que as famílias, de modo geral, iam ao armazém de sua confiança e compravam tudo quanto necessário e pediam para “marcar na caderneta”. Eram os fiéis “fregueses de caderneta”.
Com o passar dos tempos e pela própria mudança de costumes e conceitos, com o surgimento de outras oportunidades e opções, a concorrência aumentou, os procedimentos foram se modificando também.
Hoje as cadernetas estão “aposentadas”.
Razão principal: não davam quase nenhum lucro para o credor, que levava cerca de 30 dias para receber o que vendeu, com o risco de precisar, ainda, parcelar o débito.
Com o advento das redes de supermercados, principalmente, os preços caíram um pouco, no início, favorecendo a fuga das cadernetas. As promoções também eram motivo de o consumidor mudar de fornecedor.
Depois, com os tíquetes refeição, cestas básicas, etc., praticamente se decretou a morte das cadernetas de crédito dos armazéns. Muitos deles, em função do modernismo, também fecharam suas portas, apesar de permanecerem na história.
QUAL A RELAÇÃO COM A ESTRADINHA?
Simples assim: quem investir na revitalização e restauração de todos os itens constantes no projeto de concessão NÃO PODERÁ apostar num retorno imediato, inviável, financeiramente.
Começar a revitalização e restauro por Campos do Jordão é entender a evidência de onde é possível acontecer retorno financeiro mais imediato, mais consistente e mais valorizado, o ano todo.
O mesmo se dá com Santo Antônio do Pinhal, onde o turismo sazonal, de aventura, de contemplação, gastronômico, cultural, dentre outros, está consolidado.
Essas duas Estâncias Turísticas não pararam com o turismo quando a ferrovia parou.
Tristemente isso não aconteceu com Pindamonhangaba. Não temos, efetivamente, um programa receptivo para motivar turistas a estarem na cidade, pelo menos por um ou dois dias, ocupando meios de hospedagem, se alimentando, comprando lembranças, visitando atrativos formatados.
Não há o despertar técnico capaz de, em curto prazo, criar ferramentas de retenção do turista no município.
O comércio de bens e serviços, de modo geral, não está motivado ou não tem interesse em acreditar que o Turismo Receptivo seja a bola da vez.
Seria interessante todos, todos mesmo, despertarem desse sonho romântico de verem a Estradinha funcionando, como querem muitos, o mais rápido possível.
A relação entre entes públicos e privados é essencial, indispensável, urgente.
Conselhos Municipais devem estar atentos ao fundamento do projeto, sugerindo, desde já, programas de capacitação aos diversos setores prestadores de serviços e fornecedores de bens, integrantes do trade turístico.
A “TRADUÇÃO”
A fala do governador Tarcísio de Freitas, na cidade de Lagoinha, é explícita e não pode ser “lida” com olhos de bairrismo.
Atentem para o que foi divulgado:
"De acordo com o governador, o trecho urbano de Pindamonhangaba entrará no edital de concessão, com data prevista para publicação em agosto. “A demanda de Pindamonhangaba já está resolvida. Vai entrar como investimento contingente e a gente vai recuperar o trecho urbano de Pindamonhangaba”, afirmou o governador”. (Fonte fidedigna).
Nada tão claro, bastando compreender, entender, destrinchar os significados.
“Demanda entrará como INVESTIMENTO CONTIGENTE": investimento não obrigatório imediatamente”.
Qual a demanda dos “players” pela retomada da ferrovia? O imediato funcionamento dos trens. Isso não acontecerá.
“Recuperar o trecho urbano de Pindamonhangaba”, como já está desde o início no projeto apresentado em audiências públicas. Todos os 28km serão recuperados, os imóveis, conforme descritivo no projeto, etc. Isso NÃO É AFIRMAR QUE OS TRENS VIRÃO A FUNCIONAR DE IMEDIATO.
UMA POSSIBILIDADE
A contingência estabelecida para o trecho de Pindamonhangaba pode vir a ser, caso o concessionário principal encontre parceiro interessado, motivo de investimentos terceirizados, não onerando o projeto inicial. Algo muito arriscado e remoto.
Assim, esperamos que todos os envolvidos com as ações pleiteando a verdadeira ressurreição da ferrovia, atentem para os textos, as expressões técnicas e não se esvaiam em discursos capazes de se tornarem iludidos, apesar dos muitos avisos nossos.
Há, também, a necessidade de se entender que quaisquer alterações de trajeto ou de projeto demandariam, legalmente, mais estudos, outros cálculos financeiros e de tempo, modificariam o cronograma atual e, exigiriam outra audiência pública e, principalmente, AFUGENTARIAM muitos consórcios já interessados no processo de concessão.
Apesar de boatos, existem grupos interessados na concessão. Não se trata de cartas marcadas, são reações naturais de quem acredita no turismo como forte propulsor da economia de qualquer cidade.
Pensar coletivamente, positivamente é agir com inteligência, sensatez e vontade de ver as coisas acontecerem além das cores ou sentimentos partidários.
Penso assim, assino.
Marcos Ivan de Carvalho
Jornalista independente, MTE91.207/SP
Membro do Conselho Deliberativo da AMITur (Associação Brasileira dos Municípios de Interesse Cultural e Turístico)
Filiado à ABRAJET/SP (Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo, seccional SP)
Gestor de Turismo pelo Instituto Federal do Rio de Janeiro/MTur/MEC